Por Bruna Tibolla, Brasil
Paulo Freire (1992, p. 05), em Pedagogia da Esperança, afirma que a esperança é imperativo existencial e histórico e que junto dela faz-se necessário andar a consciência e a ação crítica e comungando do olhar sensível e cuidadoso de nosso Patrono é que a educação sob a ótica da cultura da paz vem ampliando sentidos e horizontes.
As práticas restaurativas partem do pressuposto da construção de um capital social e da disciplina social a partir do aprendizado participativo e do processo justo de aprendizagem e senso de comunidade. Em suma, os seres humanos são felizes e cooperativos em prol da mudança, quando os demais, que ocupam posições hierarquizadas realizam atividades com eles e não para eles ou por eles. (Wachtel, 2013, p. 03).
A partir da metodologia das escolas restaurativas abrimos os braços para a empatia. Ora, se o espaço de fala é legitimado para todos os sujeitos envolvidos, a responsabilidade coletiva pelas escolhas também é de todas e todos na construção de escolas restaurativas com enfoque em direitos humanos, bem como, a utilização de formas não punitivas no que tange à gestão de conflitos e a construção de possibilidades de aplicação nas formações para as educandas e os educandos. Para tanto, as possibilidades se configuram sob o viés dos processos circulares, salientados por uma das maiores referências no tema, Kay Pranis, (2010, p. 16). Para a autora o poder da praticar circular se dá sob o contar histórias, e que, cada história oferece uma lição. Todas as histórias ali contadas, nos círculos, se unem à humanidade de outras histórias e auxiliam na percepção e beleza da profundidade de ser humano.
POR QUE TRAZER OS CÍRCULOS PARA AS ESCOLAS?
A concepção das práticas restaurativas dentro dos espaços educativos concebe a educação a partir do comprometimento coletivo como ferramenta para a construção de uma sociedade em que os sujeitos exercitem a sua plena participação e busquem uma vida com significado. A educação para a cultura da paz acredita que escolas devem ser espaços de comunidade, continuidade e cuidado diário. Os círculos quando utilizados de maneira regular e rotineira podem ser uma importante escolha na construção de espaços saudáveis e em que os relacionamentos realmente importem.
Nesse sentido Kay Pranis e Caroline Watson ao criarem o material No Coração da Esperança (2011) enaltecem que, pensar práticas restaurativas, significa olhar para as dimensões relacionais do ser humano, bem como, para seu desenvolvimento social e consciência emocional. Quando se apresentam possibilidades de conexão humana e desenvolvimento de vínculos, a partir das metodologias circulares, a pretensão é que tais habilidades se tornem habituais na vida dos sujeitos e de suas relações.
O que estamos praticando nos círculos?
Durante a leitura anterior mencionamos o poder que emana do círculo e da conexão humana quando em processo circular. Mas, afinal de contas o que estamos praticando quando participamos de práticas circulares. A construção do material Círculos em Movimento: construindo uma comunidade escolar restaurativa de autoria de Caroline Boyes Watson e Kay Pranis (2018, p. 23-24) enaltece a potência de se trabalhar círculos em espaços educativos.
Respeito: no círculo todas as perspectivas são consideradas.
Igualdade: todas e todos no círculo tem igual oportunidade de se expressar.
Empatia e Alfabetização Emocional: durante o círculo temos maior oportunidade de reflexão sobre o que estamos sentindo do que comumente estamos acostumados.
Solução de problemas: o pressuposto inicial de um círculo é que todos os participantes tem capacidade de pensar estratégias para resolver problemas e conflitos.
Responsabilidade: a estrutura física de um círculo engloba responsabilidades não-verbais e engajamento de todas.
Autocontrole e autoconscientização: todos os participantes precisam exercitar o autocontrole para que as resoluções e tratativas ali aconteçam.
Liderança Compartilhada: O círculo é uma prática de democracia fundamental na qual todas as vozes são ouvidas e todos os interesses devem ser tratados com dignidade.
ESTRATÉGIAS DE MANEJO DE CONFLITO
O interesse nas práticas restaurativas por parte dos espaços socioeducativos tem crescido muito uma vez que a necessidade de olhar para os comportamentos, não como um problema, mas com empatia e consideração também se faz presente. As práticas restaurativas ajudam a lidar com violência, bullying e demais necessidades que ocorrem no meio escolar que não é suportada pela disciplina punitiva tradicional uma vez que esta não consegue obter mudanças positivas no comportamento de estudantes. Contudo, quando se apresenta as práticas restaurativas como estratégia de manejo de conflito de forma não violenta o espaço escolar obtém novas possibilidades e soluções para lidar com desafios cotidianos considerando o respeito e a empatia a todos os seres humanos pertencentes à rede. (Costello, Wachtel E Wachtel, 2011, p.13).
Sabemos que escolas são comunidades intensas, dinâmicas e que buscam diariamente estratégias e formas de pensar convivência. A maneira como os relacionamentos são construídos e vivenciados implica no sucesso da comunidade de aprendizagem como um todo. Além disso, nas linhas anteriores compreendemos que os círculos são vistos como um espaço intencional altamente estruturado, dedicado a promover a conexão, a compreensão e o diálogo no grupo. Diante disso, vem o questionamento? Por que é tão difícil romper com a estrutura tradicional apresentada nas escolas e ousar pensar outras possibilidades como o uso do círculo na gestão de conflitos e rotina diária?
- Os Círculos nos pedem para desacelerar e estar presentes: Quando sentamos em Círculo, nós estamos “nadando contra a corrente” das rotinas tradicionalmente inseridas na própria estrutura do cotidiano escolar.
- A igualdade no Círculo está em tensão com as hierarquias: quando sentamos em círculos inexiste a superioridade, a altura e a subserviência da postura de uma cadeira atrás da outra. Todos e todas estão em igual posição e isso pode gerar tensionamentos em relação à hierarquia geralmente dirigida ao professor e às equipes gestoras que, inseridos em uma prática habitual tradicionalmente construída refletem a dificuldade de transpor as barreiras dos níveis hierárquicos.
- Os Círculos nos convidam a falar a partir do coração e a lidar com as emoções: reunidos em torno de um mesmo propósito e ouvindo o coração, expressando-se com verdade e respeito torna-se mais fácil que nos entreguemos e vivenciamos nossas emoções com vivacidade.
- Os Círculos pedem que priorizemos a construção de bons relacionamentos: durante o espaço de corresponsabilização e conexão é preciso, verdadeiramente, acreditar que a partilha e relacionamentos saudáveis estão sendo construídos para que no aproximemos sem julgamentos, por isso torna-se tão difícil.
Iniciamos essa construção teórica a partir do olhar de Paulo Freire que nos ensina diariamente a ESPERANÇAR. Esperança é o que move os processos círculos dentro dos espaços educativos para a construção de sociedades mais pacíficas e respeitosas. A cultura da paz se constrói a partir da cooperação, do amor, da educação para todas e todos e com escuta empática e ativa de toda a comunidade educadora.
É preciso ousadia para se descobrir novas formas de se fazer o educar, no entanto, as respostas para a gestão de conflitos são encontradas no coração de cada uma e de cada um. Não se muda uma escola sem as pessoas que a constroem. Juntas e juntos, podemos sempre mais.
REFERÊNCIAS
COSTELLO, B.; WACHTEL J.; WACHTEL, T. Círculos Restaurativos Nas Escolas: construindo um sentido de comunidade e melhorando o aprendizado. Instituto Internacional de Práticas Restaurativas: Perú, 2011.
FREIRE, P. Pedagogia da Esperança: reencontro com a Pedagogia do Oprimido. Disponível em: http://peadanosiniciais.pbworks.com/f/Pedagogia_da_Esperanca_-_Paulo.pdf. Acesso em 27/05/2019.
HOPKINS, B. Práticas Restaurativas na Sala de Aula. Disponível em: http://www.palasathena.org.br/downloads/praticasrestaurativasnasaladeaula.pdf. Acesso em: 27/04/2019.
WACTHEL, T.. Definindo o termo restaurativo. Disponível em: http://www.iirp.edu/pdf/Defining-Restorative-Portuguese.pdf. Acesso em: 27/05/2019.
PRANIS, K. Processos Circulares de construção de paz. São Paulo, Palas Athena: 2010.
WATSON, C. B.; PRANIS, K. No Coração da Esperança: guia de práticas circulares. Justiça para o século 21: Porto Alegre, 2011.
PRANIS, K.; WATSON, C. Círculos em Movimento: Construindo Uma Comunidade Restaurativa. Disponível em: http://www.ajurisjr.org.br/circulosemmovimento/downloads/.